terça-feira, julho 14, 2009

Comunicação

"Que arriscado e conturbante é a gente se tirar das solidões fortificadas!" (Guimarães Rosa)

Homens como Samuel Morse, inventor do telégrafo, Alexander Graham Bell, que desenvolveu o telefone, e tantos outros que devotaram seu gênio e seu suor a facilitar a comunicação entre os seres humanos, ficariam atônitos se voltassem ao mundo nos dias de hoje e pudessem ver como as coisas são agora. Hoje, quase todo mundo anda com um aparelhinho de bolso por meio do qual pode ser encontrado a qualquer momento e quase em qualquer lugar. Textos, imagens, músicas e vídeos podem ser enviados de um lado a outro do globo de forma instantânea e sem custo algum. Não há mais o menor perigo de duas pessoas perderem o contato, estejam onde estiverem. Sentado aqui, à minha mesa de trabalho, numa cidadezinha do interior do Rio Grande do Sul, posso contatar meus amigos de São Paulo, da Itália ou do Japão, sem ao menos precisar tirar a bunda do assento. Sim, são coisas espantosas e maravilhosas, se pararmos para pensar por um instante.

O que é tristemente irônico é que toda essa facilidade de nos comunicarmos não parece estar contribuindo para aproximar as pessoas. A não ser em casos raros e específicos, parece ocorrer o contrário: esses novos aparatos nos soterram sob avalanches de informação sem sentido que acaba gerando apatia, e nos colocam em contato superficial com multidões de pessoas - impedindo um contato profundo com qualquer uma delas. A caixa de entrada de meu e-mail do trabalho é bombardeada diariamente com 20 a 30 mensagens, a maioria trazendo anexos enormes, contendo instruções, relatórios, normativos, notícias, estatísticas e sabe Deus o que mais, enviadas por diferentes setores da instituição para todos os nomes de uma imensa lista da qual, infelizmente, eu faço parte. Nunca vou ler isso tudo, a menos que deixe de trabalhar para cuidar só do e-mail, mas alguém pensa nisso antes de me mandar arquivos em PDF com 30, 40 páginas? O MSN virou uma ferramenta indispensável para gerenciarmos nossos contatos, sejam eles pessoais ou profissionais, mas também nos reduziu, aos olhos uns dos outros, a simples rostos e nomes. Adolescentes, e também outros que já não o são há um bom tempo, gabam-se (como se isso tivesse algum mérito) de ter 150 “amigos” no MSN ou no orkut. A vontade que me dá é perguntar: amigos? Amigos? Quantas dessas 150 pessoas realmente sabem quem você é, ou quantas delas você realmente sabe quem são? Quantas conhecem ao menos detalhes básicos a seu respeito, como em que cidade nasceu, que tipo de música prefere ou como é sua relação com sua família? Com qual dessas pessoas você pode contar quando está triste e precisa conversar? Eu tenho seis pessoas no MSN e já acho isso quase demais. Só considero uma dessas pessoas realmente uma amiga (porque, como no caso de tantas outras palavras, também esta é usada por aí com excessiva liberalidade para o meu gosto). Tirando isso, a maioria das pessoas com quem cheguei a falar por MSN apenas contribuiu para aumentar minha sensação de solidão - pois é essa a sensação que bate quando você está tentando conversar com alguém que demora 20 minutos para lhe responder porque também está falando com outras dez pessoas, além de responder e-mails, baixar músicas, assistir a vídeos, ler as notícias do dia e movimentar sua conta bancária. Tudo ao mesmo tempo.

Saí com uma jovem que não parava de atender ao celular enquanto estava comigo. Depois da terceira vez que me vi obrigado a ficar sentado com uma polida cara de quem não está ali, enquanto ela se alongava em conversas com sei-lá-quem, decidi que já tinha tido o suficiente: não voltei a sair com ela, e não senti falta. Ficar com uma pessoa dessa maneira é só uma outra forma de solidão. E parece que essa é uma tendência generalizada: você tem dezenas de amigos, mas quando foi a última vez que se sentou com um desses amigos por algumas horas, com os celulares desligados, para conversar, ou fazer algo juntos, ou não fazer nada, simplesmente ficar na presença de alguém que é seu amigo e sentir que isso lhe faz bem? O mundo moderno multiplicou exponencialmente a quantidade de nossas relações, mas fez a qualidade delas cair de forma abissal. Não temos mais tempo uns para os outros - parece que basta saber que a pessoa "está lá". E no entanto, que grave erro é acreditar que isso basta... Um erro que, geralmente, só percebemos quando já é demasiado tarde para repará-lo.

Por mais mirabolantes que sejam os instrumentos de comunicação ao nosso dispor, eles não são capazes de cobrir o abismo que cavamos à nossa própria volta quando estamos muito acomodados para dar-nos ao trabalho (e, o que é mais, correr o risco) de dar um passo em direção ao outro, olhá-lo nos olhos sem disfarces, dizer em alto e bom som o quanto ele é importante para nós e o quanto nos faz felizes tê-lo em nossas vidas. Não há celular a seis centavos o minuto que substitua uma boa e franca conversa, não há MSN que preencha o vazio de não ter o prazer da companhia de um amigo, não há webcam que valha por um forte e demorado abraço. Por isso, e por mais que seja verdade que "conselho é aquilo que o sábio não precisa e o tolo não aceita", eu lhe digo, a você que me lê neste momento: deixe a vergonha e os preconceitos de lado e diga hoje aos seus amigos, pais, filhos, esposa, marido, namorada, namorado e a qualquer outra pessoa de quem você goste o quando eles são importantes para você. Pare de achar desculpas para não lhes dar atenção ou passar mais tempo com eles, esqueça a internet, desligue o celular. Você chegou a este mundo sozinho e vai sair dele do mesmo jeito, portanto não desperdice a chance de ter esses preciosos companheiros de jornada ao seu lado (realmente ao seu lado, ainda que a distância) enquanto pode.