domingo, junho 20, 2010

Escrevei para entendê-las...

Seria de se esperar, com base na boa e velha lógica, que um cara que tem uma maioria de amigas, e poucos amigos, como é o caso deste que aqui digita seus confusos pensamentos, tivesse à sua disposição um panorama ilustrativo do universo feminino e melhores condições de entender como funciona a mente (e, muito mais importante, a alma) dessas fascinantes e enlouquecedoras (no bom e no mau sentido) representantes da metade da humanidade dotada de ovários. Acontece que, como em tudo relacionado às mulheres, a lógica simplesmente não funciona nesse caso.

Não espero que ajam com perfeita coerência, primeiro porque isso tiraria delas a natureza emotiva que é em grande parte a responsável por torná-las tão interessantes, e, segundo, porque acho que ninguém deveria exigir de outrem algo que também não é capaz de fazer, mas será que mexeria com a ordem do universo se existisse pelo menos uma que não agisse sempre de maneira tão estapafúrdia que, por totalmente imprevisível, acabasse se tornando previsível? (Pois, depois de um certo número de vezes ficando perplexo com os atos delas, você acaba compreendendo que só precisa perguntar-se qual seria a conduta mais absurda e sem sentido imaginável numa determinada situação, e sempre esperar isso delas. E pronto: não será mais pego de surpresa.) Sairiam os planetas de suas órbitas se porventura aparecesse uma única mulher que sentisse ao menos um pequeno desconforto cada vez que fizesse uma promessa solene para depois não a cumprir, em vez de aparentemente considerar isso uma prerrogativa de seu sexo? Ou que, antes de fazer promessas, tirasse um instante para se perguntar se iria ou não cumpri-las e, em caso negativo, não prometesse?

Quando eu tinha uns 13 anos, apareceu no meio da minha turma da escola uma publicação muito interessante que circulou de mão em mão, apenas entre os garotos - não, não era revista de sacanagem. Tratava-se de um livrinho que se propunha a ensinar macetes de como conquistar as garotas. Pouco lembro do que li nele, e o que lembro me parece, hoje em dia, ser um apanhado de coisas que não iam muito além do simples bom senso (não que, naquela idade, nós tivéssemos algum). Mas lembro que o livro era salpicado de frases de efeito, e, como na época eu já era maníaco por citações, algumas me ficaram na memória. Uma delas dizia que as mulheres são tanto melhor amadas quanto pior compreendidas. Só muitos anos depois é que eu fui perceber toda a verdade que existe por trás desse pequeno e aparentemente absurdo aforismo.

Pois a verdade, meus caros (e agora dirijo-me aos meus colegas usuários de Prestobarba) é que as meninas não querem ser compreendidas. Ou melhor, até querem, mas só pelos amigos. Não se esforce para entendê-las: de qualquer forma, é pouco provável que consiga, e, se conseguir, isso só fará com que elas deixem de vê-lo como um ente masculino - você vai virar um amigo, e, para a mulher, amigo é um ser assexuado. Um homem pode vir a apaixonar-se por uma amiga, mas nunca o contrário: para uma mulher, a partir do momento em que ela passar a te considerar um amigo, qualquer possibilidade de algo mais definitivamente morreu. Para nós, a companheira desejada é uma em quem confiemos; para elas, nada existe de mais antiafrodisíaco que confiança. Isso é o que faz o cara cafajeste tão irresistível e o sincero tão sem graça. Pessoalmente, penso que a namorada, companheira, amante, esposa adequada (e notem que eu não disse "ideal", pois isso não existe) seria aquela que, além de ser todas essas coisas, fosse também minha melhor amiga, a pessoa que tivesse prioridades e interesses semelhantes aos meus, que desse importância às mesmas coisas que eu, com quem eu pudesse conversar sobre tudo, de quem eu não guardasse nenhum segredo, cuja companhia eu achasse mais divertida que a de qualquer "mano", e que me entendesse. Já para as garotas, parece ser impossível conciliar romance e sexo com esse tipo de cumplicidade: para elas, as duas áreas são incomunicáveis. Não se misturam, são água e óleo. Um cara é para namorar e transar, outro é para conversar, fazer coisas juntos, trocar desabafos, dar apoio. Os dois são necessários, mas não podem ser a mesma pessoa: um que sirva no primeiro campo fica inelegível para o segundo, e vice-versa. Assim funciona a cabeça feminina - detalhes ou motivos, eu não sei. Acho que elas também não.

Num de seus mais belos poemas, o grande Olavo Bilac diz que "ouve estrelas", e finaliza assim: "Direis agora: 'Tresloucado amigo! / Que conversas com elas? Que sentido / Tem o que dizem, quando estão contigo?' / E eu vos direi: 'Amai para entendê-las! / Pois só quem ama pode ter ouvido / Capaz de ouvir e de entender estrelas.'" Não sei até que ponto amar pode ajudar a entender seja o que for, e uma das vantagens de ser poeta é estar dispensado de ser fiel aos fatos (é a famigerada "licença poética"), mas, num primeiro momento, pareceu-me que escrever a respeito - já que escrever sempre me ajuda a organizar os pensamentos - poderia me fazer chegar um pouco mais perto de entender esses seres maravilhosos e enfurecedores chamados mulheres. Ledo engano: entendê-las não é possível, e, se o fosse, não serviria para nada. Compreendidas ou não, elas continuariam prometendo e não cumprindo, desejando coisas e temendo-as ao mesmo tempo, buscando seus sonhos com persistência e coragem que nós homens nunca conseguiríamos igualar e, ao se verem cara a cara com a possibilidade da realização do sonho, virando as costas e fugindo. De qualquer forma, as estrelas, apesar de "femininas", são interlocutoras bem mais acessíveis!

quinta-feira, junho 03, 2010

Adeus ao Mestre

Já faz um certo tempo que deixei de acreditar naquele lugar-comum de que "nada é por acaso"; embora inegavelmente confortador, esse surrado aforismo simplesmente não encontra sustentação nos fatos. Porém, há uma outra frase que, bem menos repisada, continua a me parecer que tem chances de ser verdadeira. Esta diz que "tudo acaba onde começou". Pois foi meu irmão, a mesma pessoa que, há mais de 20 anos, me apresentou a admirável música de Ronnie James Dio, quem me deu, na sexta-feira, 21 de maio, a notícia de que o golden voice havia falecido cinco dias antes, no domingo, 16 - ele comentou o fato comigo quando cheguei em casa na noite de sexta, depois de, como de costume, passar a semana fora a trabalho.

Dio faria 68 anos agora em julho. Nascido em meio à tensão da Segunda Guerra Mundial, foi testemunha ocular do surgimento do rock’n’roll, que coincidiu aproximadamente com sua adolescência. Ao longo de uma carreira de quase 50 anos, viu e fez muita coisa, sendo que, durante as últimas três décadas e meia, esteve entre os principais responsáveis pelos grandes feitos praticados por nada menos que três das maiores bandas de toda a história do som pesado. Primeiro, no Rainbow, onde sua curta mas inspiradíssima parceria com o grande guitarrista Ritchie Blackmore produziu, durante cerca de três anos, um generoso punhado das coisas mais pungentemente belas que já ouvi: a simples menção de títulos como Catch the Rainbow, Snake Charmer, Sixteenth Century Greensleeves, Tarot Woman, Stargazer, Gates of Babylon e Lady of the Lake atinge como flechas o coração de qualquer um que conheça essas músicas. Mais tarde, foi a vez do Black Sabbath, onde a entrada de Dio calou a boca dos que achavam que a saída de Ozzy Osbourne seria o fim da banda (aliás, sem tirar o valor de Ozzy, sempre preferi Dio, um cantor que dava mais importância à música e menos ao showmanship, fora o fato de eu achar sua voz incomparavelmente mais bonita e de sua técnica ser indiscutivelmente superior). Por fim, Dio teve sua própria banda, que levou seu nome, e nela conseguiu mostrar que o peso do heavy metal, alimentado por sua voz incomparável e pelos solos únicos e empolgantes do jovem guitarrista irlandês Vivian Campbell, sem falar da participação de vários outros músicos extraordinários, envolvendo letras oníricas e inspirativas, por vezes de uma profundidade atordoante, podia impulsionar os sonhos de muita gente. Nos últimos tempos, novamente ao lado dos companheiros do Black Sabbath, embora com o nome Heaven and Hell, gravou dois discos excelentes e criou altas expectativas em todos os seus fãs... Expectativas que terminaram de repente em 16 de maio.

Tive a felicidade de estar presente em dois shows de Dio com sua banda própria - um em Porto Alegre, em 2001, e outro em São Paulo, em 2006. E afirmo que ele foi mais do que apenas um cantor formidável (embora eu não consiga pensar em nenhum outro vocalista de metal que sequer chegue perto dele) e um excelente letrista e compositor. Soube ser tudo isso à sua própria maneira, construiu sua própria lenda talvez sem perceber que estava fazendo isso: como um bardo medieval, falava à imaginação de quem o ouvia, e mexia com emoções que, uma vez postas em movimento, faziam de quem ouvia sua música uma pessoa diferente - se a música fosse ouvida do jeito certo, que não pode ser expresso com palavras. Dio fazia-nos ver que existe magia em lugares onde pessoas comuns não a enxergam. Como ele dizia, olhar para um arco-íris e não sentir nada é já estar morto. Não com seu discurso, mas com sua música (pois, ao contrário de outros astros de rock, Dio nunca foi de fazer discursos messiânicos), aprendi que sonhar é necessário, e que o mais importante não é se é possível ou não que nossos sonhos se realizem - pelo simples fato de existir, o sonho nos modifica para melhor.

Descanse em paz, Ronnie James Dio. Seu coração sagrado continuará a ser para nós como um arco-íris na escuridão.

Sacred Heart

(Dio/Appice/Bain/Campbell)

The old ones speak of winter
The young ones praise the sun
And time just slips away

Running into nowhere
Turning like a wheel
And a year becomes a day

Whenever we dream
That's when we fly
So here is a dream
For just you and I

We'll find the Sacred Heart
Somewhere bleeding in the night
Look for the light
And find the Sacred Heart

Here we see the wizard
Staring through the glass
And he's pointing right at you

Now you can see tomorrow
The answer and the lie
And the things you've got to do

Oh, sometimes you never fall
And ah - You're the lucky one
But oh - Sometimes you want it all
You've got to reach for the sun

And find the Sacred Heart
Somewhere bleeding in the night
Oh look to the light
You fight to kill the dragon
And bargain with the beast
And sail into a sight

You run along the rainbow
And never leave the ground
And still you don't know why

Whenever you dream
You're holding the key
It opens the door
To let you be free

And find the Sacred Heart
Somewhere bleeding in the night
Run for the light
And you'll find the Sacred Heart

A shout comes from the wizard
The sky begins to crack
And he's looking right at you - Quick
Run along the rainbow
Before it turns to black - Attack