quinta-feira, junho 03, 2010

Adeus ao Mestre

Já faz um certo tempo que deixei de acreditar naquele lugar-comum de que "nada é por acaso"; embora inegavelmente confortador, esse surrado aforismo simplesmente não encontra sustentação nos fatos. Porém, há uma outra frase que, bem menos repisada, continua a me parecer que tem chances de ser verdadeira. Esta diz que "tudo acaba onde começou". Pois foi meu irmão, a mesma pessoa que, há mais de 20 anos, me apresentou a admirável música de Ronnie James Dio, quem me deu, na sexta-feira, 21 de maio, a notícia de que o golden voice havia falecido cinco dias antes, no domingo, 16 - ele comentou o fato comigo quando cheguei em casa na noite de sexta, depois de, como de costume, passar a semana fora a trabalho.

Dio faria 68 anos agora em julho. Nascido em meio à tensão da Segunda Guerra Mundial, foi testemunha ocular do surgimento do rock’n’roll, que coincidiu aproximadamente com sua adolescência. Ao longo de uma carreira de quase 50 anos, viu e fez muita coisa, sendo que, durante as últimas três décadas e meia, esteve entre os principais responsáveis pelos grandes feitos praticados por nada menos que três das maiores bandas de toda a história do som pesado. Primeiro, no Rainbow, onde sua curta mas inspiradíssima parceria com o grande guitarrista Ritchie Blackmore produziu, durante cerca de três anos, um generoso punhado das coisas mais pungentemente belas que já ouvi: a simples menção de títulos como Catch the Rainbow, Snake Charmer, Sixteenth Century Greensleeves, Tarot Woman, Stargazer, Gates of Babylon e Lady of the Lake atinge como flechas o coração de qualquer um que conheça essas músicas. Mais tarde, foi a vez do Black Sabbath, onde a entrada de Dio calou a boca dos que achavam que a saída de Ozzy Osbourne seria o fim da banda (aliás, sem tirar o valor de Ozzy, sempre preferi Dio, um cantor que dava mais importância à música e menos ao showmanship, fora o fato de eu achar sua voz incomparavelmente mais bonita e de sua técnica ser indiscutivelmente superior). Por fim, Dio teve sua própria banda, que levou seu nome, e nela conseguiu mostrar que o peso do heavy metal, alimentado por sua voz incomparável e pelos solos únicos e empolgantes do jovem guitarrista irlandês Vivian Campbell, sem falar da participação de vários outros músicos extraordinários, envolvendo letras oníricas e inspirativas, por vezes de uma profundidade atordoante, podia impulsionar os sonhos de muita gente. Nos últimos tempos, novamente ao lado dos companheiros do Black Sabbath, embora com o nome Heaven and Hell, gravou dois discos excelentes e criou altas expectativas em todos os seus fãs... Expectativas que terminaram de repente em 16 de maio.

Tive a felicidade de estar presente em dois shows de Dio com sua banda própria - um em Porto Alegre, em 2001, e outro em São Paulo, em 2006. E afirmo que ele foi mais do que apenas um cantor formidável (embora eu não consiga pensar em nenhum outro vocalista de metal que sequer chegue perto dele) e um excelente letrista e compositor. Soube ser tudo isso à sua própria maneira, construiu sua própria lenda talvez sem perceber que estava fazendo isso: como um bardo medieval, falava à imaginação de quem o ouvia, e mexia com emoções que, uma vez postas em movimento, faziam de quem ouvia sua música uma pessoa diferente - se a música fosse ouvida do jeito certo, que não pode ser expresso com palavras. Dio fazia-nos ver que existe magia em lugares onde pessoas comuns não a enxergam. Como ele dizia, olhar para um arco-íris e não sentir nada é já estar morto. Não com seu discurso, mas com sua música (pois, ao contrário de outros astros de rock, Dio nunca foi de fazer discursos messiânicos), aprendi que sonhar é necessário, e que o mais importante não é se é possível ou não que nossos sonhos se realizem - pelo simples fato de existir, o sonho nos modifica para melhor.

Descanse em paz, Ronnie James Dio. Seu coração sagrado continuará a ser para nós como um arco-íris na escuridão.

Sacred Heart

(Dio/Appice/Bain/Campbell)

The old ones speak of winter
The young ones praise the sun
And time just slips away

Running into nowhere
Turning like a wheel
And a year becomes a day

Whenever we dream
That's when we fly
So here is a dream
For just you and I

We'll find the Sacred Heart
Somewhere bleeding in the night
Look for the light
And find the Sacred Heart

Here we see the wizard
Staring through the glass
And he's pointing right at you

Now you can see tomorrow
The answer and the lie
And the things you've got to do

Oh, sometimes you never fall
And ah - You're the lucky one
But oh - Sometimes you want it all
You've got to reach for the sun

And find the Sacred Heart
Somewhere bleeding in the night
Oh look to the light
You fight to kill the dragon
And bargain with the beast
And sail into a sight

You run along the rainbow
And never leave the ground
And still you don't know why

Whenever you dream
You're holding the key
It opens the door
To let you be free

And find the Sacred Heart
Somewhere bleeding in the night
Run for the light
And you'll find the Sacred Heart

A shout comes from the wizard
The sky begins to crack
And he's looking right at you - Quick
Run along the rainbow
Before it turns to black - Attack

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